ESCOLHAS DE UMA VIDA Martha Medeiros
A certa altura do filme Crimes e Pecados, o personagem
interpretado por Woody Allen diz: "Nós somos a soma
das nossas decisões". Essa frase acomodou-se na minha
massa cinzenta e de lá nunca mais saiu.
Compartilho do ceticismo de Allen: a gente é o que a
gente escolhe ser, o destino pouco tem a ver com isso.
Desde pequenos aprendemos que, ao fazer uma opção,
estamos descartando outra, e de opção em opção vamos
tecendo essa teia que se convencionou chamar "minha
vida".
Não é tarefa fácil. No momento em que se escolhe ser
médico, se está abrindo mão de ser piloto de avião. Ao
optar pela vida de atriz, será quase impossível
conciliar com a arquitetura. Se é a psicologia que se
almeja, pouco tempo sobrará para fazer o curso de
odontologia. Não se pode ter tudo.
No amor, a mesma coisa: namora-se um, outro, e mais
outro, num excitante vaivém de romances. Até que chega
um momento em que é preciso decidir entre passar o
resto da vida sem compromisso formal com alguém,
apenas vivenciando amores e deixando-os ir embora
quando se findam, ou casar, e através do casamento
fundar uma microempresa, com direito a casa própria,
orçamento doméstico e responsabilidades. As duas
opções têm seus prós e contras: viver sem laços e
viver com laços. Escolha.
Morar em Londres ou numa chácara? Ter filhos ou não?
Posar nua ou ralar atrás de um balcão? Correr de kart
ou entrar para um convento? Fumar e beber até cair ou
virar vegetariano e budista? Todas as alternativas são
válidas,mas há um preço a pagar por elas.
Quem dera pudéssemos ser uma pessoa diferente a cada 6
meses, ser casados de segunda a sexta e solteiros nos
finais de semana, ter filhos quando se está
bem-disposto e não tê-los quando se está cansado,
viver de poesia e dormir em hotel 5 estrelas. No way.
Por isso é tão importante o auto-conhecimento. Por
isso é necessário ler muito, ouvir os outros, estagiar
em várias tribos, prestar atenção ao que acontece em
volta e não cultivar preconceitos. Nossas escolhas não
podem ser apenas intuitivas, elas têm que refletir o
que a gente é. Lógico que se deve reavaliar decisões e
trocar de caminho: ninguém é o mesmo para sempre. Mas
não para anular a vivência do caminho anteriormente
percorrido. A estrada é longa e o tempo é curto.
Quanto menos a gente errar, melhor.